Manter as culturas e as tradições vivas é um desígnio que não se faz por decreto. Depende da vontade, do empenho e da dedicação daqueles/as que decidem consagrar parte da sua vida a um estudo das raízes, dos seus porquês, das suas transformações em alargados contextos sociais, políticos, financeiros, e dos seus actores originais. E depende de um interesse genuíno em aprender, compreender e amplificar as razões e as vozes desses guardiães das identidades dos povos, ajudando a dignificá-las e a divulgá-las para que a sua História fique contada, mas também para que possa continuar a construir-se. O Prémio Imaterial distingue, precisamente, personalidades que pela sua acção desempenham esse papel e nos aproximam da tradição musical como matéria viva.
Depois do músico Kepa Junkera, da etnomusicóloga e produtora Lucy Durán e do antropólogo Paulo Lima, o Prémio Imaterial é este ano entregue à etnomusicóloga, professora e investigadora Salwa Castelo-Branco. Nascida no Cairo em 1950, filha do compositor Aziz El-Shawan, cresceu num ambiente profundamente musical. A sua formação passou, desde cedo, pela música clássica ocidental, tendo seguido um caminho que a levou a formar-se como pianista na prestigiada Manhattan School Music. Mas a curiosidade em aprofundar os contextos musicais levá-la-ia a enveredar pela etnomusicologia, ainda nos Estados Unidos onde se doutorou na Columbia University em Nova Iorque e iniciou a sua carreira académica como professora na New York University (1979-1982). Chegou a Portugal, por via do casamento com o físico teórico Gustavo Castelo-Branco, prosseguindo a sua carreira académica no Departamento de Ciências Musicais da Universidade Nova de Lisboa, desde1982.
A sua investigação no terreno tem-se centrado, desde então, em Portugal, no Egipto e em Omã, com um foco particular em política cultural, nacionalismo musical, identidade, música e media, modernidade, patrimonialização, e música e conflito. Professora Emérita de Etnomusicologia da Universidade Nova de Lisboa, leccionou também na New York University ou nas universidades de Columbia, Princeton, Chicago e Califórnia em Berkeley. Por cá, leccionou na Universidade Nova de Lisboa onde fundou o Instituto de Etnomusicologia – Centro de Estudos em Música e Dança, coordenou a essencial Enciclopédia da Música em Portugal no Século XX, publicou vários estudos sobre música tradicional portuguesa e participou activamente nas candidaturas do fado e do cante alentejano a Património Imaterial da Humanidade. Foi igualmente Presidente do International Council for Traditional Music, a maior organização académica mundial no domínio da etnomusicologia. É uma das mais importantes estudiosas e promotoras das ciências musicais em Portugal. Sem o seu trabalho, saberíamos muito menos sobre nós.